18º Congresso Abraji Ataques à Democracia | Ataques à Imprensa | Direitos Humanos | Eleições

Jornalistas debatem mecanismos de proteção no Congresso da Abraji

Palestrantes denunciam “negligência histórica do Estado” na proteção dos profissionais e sugerem mudanças

Por Gabriel Nassif | Edição: Laura Scofield | Foto: Pedro Moreira/Abraji

Para proteger o jornalismo, primeiro é necessário proteger os jornalistas. Esta é a reflexão proposta pela mesa “Jornalismo sob ataque: onde procurar ajuda” nesta sexta-feira (30) no 18º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). O evento, que aconteceu no segundo dia do Congresso, debateu mecanismos para proteção de jornalistas e garantia dos direitos destes profissionais.

Para Giuliano Galli, coordenador da área de jornalismo e liberdade de expressão do Instituto Vladimir Herzog, este tipo de iniciativa é necessário, já que houve uma “negligência histórica do Estado brasileiro” na proteção desses profissionais. Daniel Giovanaz, coordenador de projetos na Repórteres sem Fronteiras, ressaltou que debater o tema é importante para “a preservação da nossa democracia”.  

Além de Galli e Giovanaz, também estavam entre os convidados da mesa Charlene Nagae, co-fundadora e editora executiva do Instituto Tornavoz; Raísa Ortiz, representante da Artigo 19; e Samira de Castro, presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj); sob mediação da secretária-executiva da Abraji, Cristina Zahar. 

Todos são integrantes de um grupo que une 11 organizações da sociedade civil com o objetivo de garantir a defesa da liberdade de imprensa de maneira coletiva e melhorar a situação da proteção aos jornalistas no país. O grupo tem se organizado para acompanhar eventos que podem resultar em violência contra jornalistas e documentar os casos. Atuaram, por exemplo, durante o 1º e 2º turno da eleição presidencial de 2022 e durante as invasões aos prédios públicos em Brasília em 8 de janeiro deste ano. 

“A gente está atuando junto dada a conjuntura, em uma leitura de que juntos somos mais fortes”, explicou Ortiz. “O que aconteceu no Brasil nos últimos quatro anos está relacionado a uma institucionalização da violência contra jornalistas e comunicadores. Não é novidade a violência contra jornalistas e comunicadores no Brasil, nós temos números altíssimos. O que foi novidade nos últimos quatro anos foi que isso partiu das autoridades do Estado, sobretudo do Executivo Federal, e usando o aparato estatal abertamente”. 

De acordo com ela, isso guarda “semelhança com a ditadura”, já que teria havido uma tentativa de “silenciamento das vozes, sobretudo das vozes críticas ao governo federal e à questão da pandemia”. 

A mediadora, Cristina Zahar, concorda: “Durante os quatro anos do governo Bolsonaro, ou do desgoverno, os ataques mais do que quadruplicaram” em relação aos anos anteriores, ela disse.  

Entre os tipos de ataques aos jornalistas estão a violência física, a intimidação, o assédio judicial – que ocorre quando processos judiciais são utilizados como instrumentos de perseguição e intimidação – e a difamação online, que afeta principalmente as mulheres. 

Também foi citado o caso do jornalista britânico Dom Phillips, assassinado em junho do ano passado enquanto fazia uma apuração sobre o Vale do Javari, na Amazônia brasileira. Ele estava acompanhado de Bruno Pereira, coordenador geral de Indígenas Isolados e de Recente Contato da Funai, que também foi morto. 

Para Giovanaz, a reação do Estado às mortes de Bruno e Dom demonstra a importância da atuação conjunta do poder público para garantir a segurança de coberturas perigosas, como as que acontecem na Amazônia. “Infelizmente o que a gente percebe é que o governo acaba reagindo quando há pressão”, conclui.

Também foi lembrado o assassinato do jornalista Tim Lopes, em junho de 2002, que inspirou a criação de um programa de proteção aos jornalistas pela Abraji: o Programa Tim Lopes. 

“É preciso que o Estado brasileiro garanta a proteção de jornalistas”, avaliou Samira de Castro, da FENAJ. “A gente precisa estar vigilante, [a gente] precisa que a categoria de alguma forma procure as entidades para denunciar o tipo de violência que sofre, e não a naturalize. Eu acho que essa é a palavra-chave. A gente não pode naturalizar a ideia de que jornalismo é uma profissão de risco. Não é. A liberdade de imprensa é uma garantia do nosso trabalho, e a gente não pode ser intimidado, hostilizado e perseguido”, concluiu ela. 

Para tal, os palestrantes consideram que é necessário que sejam tomadas uma série de medidas, seja por parte do Estado, dos chefes das redações e dos próprios profissionais.

Para Charlene Nagae, um dos caminhos é com a criação de canais de comunicação com os ministérios e grandes organizações para garantir a apuração de crimes contra jornalistas, o que já vem ocorrendo. Já Samira Castro, presidenta da FENAJ, aponta que as empresas de jornalismo também devem adotar “protocolos de segurança para coberturas consideradas de risco”. 

De acordo com dados do “Monitoramento de ataques a jornalistas no Brasil”, lançado pela Abraji em março, os ataques contra jornalistas cresceram 23% em 2022 em relação ao ano de 2021, chegando ao total 557 episódios. De todos os casos registrados, 61,2% dos casos envolviam discursos estigmatizantes, que caracterizam a forma de ataque mais comum. Em 56,7% dos casos gerais, os agressores foram estatais e em 41,6% havia ao menos o envolvimento de um integrante da família Bolsonaro. 

A cobertura oficial do 18º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo é realizada por estudantes, recém-formados e jornalistas integrantes da Redação Laboratorial do Repórter do Futuro, da OBORÉ, sob coordenação do Conselho de Orientação Profissional e do núcleo coordenador do Projeto. Conta com o apoio institucional da Abraji, do Instituto de Pesquisa, Formação e Difusão em Políticas Públicas e Sociais (IPFD) e da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) – Oficina de Montevideo. 

0 comentário em “Jornalistas debatem mecanismos de proteção no Congresso da Abraji

Deixe um comentário